29/11/14

... saber, sabor ...


... estava a olhar para uma tangerina. gosto da imperfeição. ou será que é ao contrário? estas, colhidas da árvore, "biológicas" como agora lhe chamam, serão as perfeitas e as outras, reluzentes, vendidas num qualquer hipermercado, com selo de marca, as imperfeitas? isto tudo porque me lembrei da minha mãe que fazia cozinha molecular e eu não sabia. é que esta coisas dos nomes modernos que se dá às coisas sempre me espantou. a minha mãe fazia uma coisa fantástica que era "desgustada" com imenso prazer. era simples, dizia ela, mas nunca parecia. eram as gelatinas de laranja. espremida a laranja era aproveitada a casca como "base" e o sumo, junto com gelatina, ia a arrefecer depois de uma boa dose de açúcar misturar tudo numa calda de cheiro sempre encantador. depois, frio. e servido na casca a laranja parecia outra. magia. ou simplesmente era surpreendente. e a tangerina está a prender-me o olhar. esta coisa de existirem as coisas fora das suas épocas sempre me fez confusão. a moda das coisas sempre presentes é fruto de uma modernidade que reclamamos cada vez mais. gelados no inverno, chá quente no verão. é a nossa forma de sermos pequenos deuses. ou de como a ciência nos deu poderes até aqui reservados ao segredo das coisas do mundo. tudo isto porque estava a pensar nestas modas. nas tendências. nessas coisas todas que a leitura apura em forma de dúvida. cada vez que nos afastamos das coisas da natureza, temos como seres humanos, essa certeza absoluta. que somos senhores de um saber que dobra a própria realidade das coisas. e depois, quando procuramos o sabor, precisamos voltar a respeitar o tempo das coisas reais. é tão curioso este jogo de rato e gato. é talvez a nossa mais natural afirmação como seres humanos. estamos divididos nisto. é curioso. muito curioso. a verdade é que, ainda bem que somos feitos de ambas as coisas. definem-nos. e é isso mesmo...

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