02/10/15

... regressar e aprender ...


«a arte é, provavelmente, uma experiência inútil; como a «paixão inútil» em que cristaliza o homem. mas inútil apenas como tragédia de que a humanidade beneficie; porque a arte é a menos trágica das ocupações, porque isso não envolve uma moral objectiva. Mas se todos os artistas da terra parassem durante umas horas, deixassem de produzir uma ideia, um quadro, uma nota de música, fazia-se um deserto extraordinário.»
agustina bessa-luís

... as mãos mostram o quanto aprendemos. hoje reparei nisso. mudamos sempre porque não paramos de aprender. nunca. e quando se regressar ao local que escolhemos para começar tudo de novo, reparamos nas coisas que mudaram. dizem-nos que muito mais mudou. desejamos que assim seja porque é a mudar que não morremos. e ao transformar, ao refazer e recriar, por mais doloroso que seja, vemos quem somos, o que somos e o que desejamos vir a ser. trago uma cozinha nas mãos e no pensamento. a nossa. a cozinha das nossas terras e das nossas gentes. mas trago também experiência. chego e sento-me. relembro-me o que a vida me ensinou: é preciso, sempre, recomeçar. estou ali para aprender. deixo de saber o que sei, mas não esqueço. o desafio é ainda maior. os segredos aprendidos são guardados. deixar sempre tudo para experimentar. aprender com tudo e com todos. os rostos conhecidos que merecem agora, ainda mais, respeito. os rostos novos, de quem se espera sempre um ar fresco, uma ideia nova, uma forma diferente de encenar os dias na cozinha. olho em volta e vejo gente que esteve em lugares desafiantes. que falam de coisas que não vi. aprendo com eles muito mais do que alguma vez terei para ensinar. cozinhar é um acto que se aprende. mas há uma parte que vem de dentro. da alma que as mãos revelam. dos sabores que se querem reconstruir porque nos são familiares. o cozinheiro é o artista. o sabor é a sua força. a beleza, de a oferecer, está para ser aprendida. é essa a mudança hoje na cozinha que se faz. dar uma forma à beleza do sabor, conservando este e revelando pela forma o que se espera encontrar num primeiro momento em que a iguaria é provada. colocada à prova. é recomeçar tudo isto. com a vontade de fazer mais e melhor. mas acima de tudo, continuar a aprender porque, de verdade, saber cozinhar é um processo que nunca se termina. é uma viagem. e somos sempre viajantes de saberes e sabores por descobrir...


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