07/03/15

... bom gosto na cozinha ...


... bom gosto. educar o gosto. o sabor. achei muito importante o chamar de atenção. num tempo de "tendências" chamar os bois pelos nomes é mais do que relevante. é determinante. a verdade é que o gosto pode ser educado. tal como o sabor. depois podemos gostar de umas coisas e de outras não. mas há algo que antecede isto tudo. chamo-lhe, à falta de melhor, a busca. a procura. tive a sorte de ter quem fizesse esse trabalho por mim, quando era miúdo. e de eu procurar o que faltou. tive sempre, familiarmente, uma cozinha com requinte. com sabores nobres e ricos. procurei, depois, por mim o resto. o sabor ganha forma quando mais rico for o desafio que nos colocamos enquanto pessoas de procurar novos aromas, novas texturas, novos paladares. o meu avô era um homem sábio no que dizia respeito à arte de bem comer. levava-me sempre com ele. dizia: prova. mesmo que não gostes, prova. aprendi com ele esse desafio de descobrir sempre mais. e depois, a construir referências. lugares seguros na arte de degustar qualquer iguaria. o arroz de marisco (que ainda hoje não é prato da minha eleição) tenho como certo que o melhor que comi foi com ele. os ninhos, da minha mãe nos anos dele. ou a sopa doce. o tornedó, no tavares. ou o bife, na trindade, que ainda hoje acho que é o melhor bife que se pode comer. e o melhor carapau grelhado que comi foi também com ele, em sesimbra. ou, já sozinho, o melhor rancho que comi foi numa viagem estranha até santa comba dão, vindo num tacho para mesa, numa tasca que nem sei se ainda existe nem se lá conseguiria voltar. referências. quando tento fazer qualquer coisa destas é ali, ao momento e ao sabor que tenho em mim como perfeito, que volto. há uma coisa que é certa: não podemos iludir ou falsear um sabor. porque a memória, a nossa, é a mais forte das coisas que nos revela o segredo do que comemos. sabemos quando algo é memorável. quando algo nos enche a alma para além de ser só um bom repasto. é o gosto. tão importante, mas tão importante é pensar e saber isto para quem cria coisas na cozinha para serem memórias para os outros. das coisas que me deixam, ainda, triste é não ter encontrado essa receita, esse prato, essa iguaria, que confeccionada por mim, deixe essa memória que todos alguma vez citámos de alguém: nunca comi nada igual ao que o/a fazia... 

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