17/03/15

... silêncio na cozinha ...


... "nós, ali, brincamos aos deuses.". e pensei na frase da peça de teatro antiga de genet. os deuses não possuem sombra. faz pensar isto de brincar aos deuses. na cozinha. mas é um pouco isso. e depois, quando inteligentemente, quem nos ensina dá liberdade para aprender, então conjugam-se os factores perfeitos para fazer desaparecer o medo e fazer aparecer o sabor. somos feito de memórias. não somos o que comemos. esta frase deu o mote. mas os deuses não comem. nós, comemos. no entanto, a expressão é sempre do manjar dos deuses. e trocamos tudo porque só queremos aquele momento. estar, um dia, depois de tantos longe desse lugar onde percebi que a cozinha era um mundo, no lugar onde se fazem as coisas doces é perceber a magia desse espanto. é aquele momento em que conjugamos coisas que são memórias nossas. nozes. laranja. canela. uma calda de açúcar. perceber que nem sempre as coisas são simples. perdido o medo, tudo é possível. quase visitar o olimpo. por instantes. é aquele instante da prova. em que o cérebro revela a sua única imperfeição. que estudei. incapaz de controlar o espanto o cérebro produz silêncio. fica-se e pede-se silêncio. para os sabores aflorarem ao corpo em forma de memórias. é mesmo um momento em que tudo se suspende. é prazer. deturpamos a palavra mas é mesmo isso. prazer. e a cozinha tem desta coisas. como muito poucos outros ambientes é aqui que podemos conjugar coisas imperfeitas. sob o nosso olhar, perceber que a + b não é sempre c. é este silêncio que procura quem cozinha. porque ele diz tudo. até o obrigado que não era preciso. ou os parabéns pela criação que foi só uma coisa efémera demais para algum dia ser recordada. ou a amizade de partilha entre quem criou. tudo se reflecte naquele silêncio. talvez seja ele, na sua imensidão, a verdadeira linguagem dos deuses...

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