03/06/15

... o desafio da cozinha ...


«...alice não pôde evitar um sorriso, ao dizer: - sabes, eu também pensava que os unicórnios eram monstros fabulosos! nunca tinha visto um vivo!
 - Bem, agora já nos vimos um ao outro – constatou o unicórnio. – se acreditares em mim, eu acredito em ti. de acordo?...»
lewis caroll

... este é o tempo que termina. de exame. de provar. é um momento desafiante. quando o corpo só pede descanso e que o deixem em paz por um pouco, quase a rebentar por todos os lados de fadiga, eis que surge o momento de provar o que se espreitou durante a viagem. nunca vi os exames como momentos de prova. vejo-os como elementos desafiantes. onde nos temos que superar. tentar, pelo menos. isto da cozinha tem muito que se lhe diga. mas a verdade é que ainda mais nestes momentos. a razão é simples. cada momento de avaliação que tenho ultrapassado tem sido definidor para mim. ao terminar, mais um, ganhei muitas dúvidas. mas muitas certezas, também. a mais importante: a que tipo de cozinha quero abraçar. a palavra que a define é simples: identidade. a ela ligo coerência e memória. percebo que se fugir disto fujo da cozinha que quero que seja a minha mesmo que saiba que devo e tenho que aprender todas as outras. e isso foi outra certeza aprendida. porque trabalhei com ingredientes que dos quais os sabores não sou particular apreciador. mas obriguei-me a isso. é um exercício reconciliador. com o gosto e o sabor. que é para os outros antes de ser para nós. nós que o preparamos. e depois o risco. a gestão do que sabemos que podemos arriscar e como o fazer. um passo de cada vez. mas caminhando sempre em frente para novas descobertas. ficar no mesmo lugar, em cozinha, é deixar morrer a vontade de criar. e isso é, sem dúvida, o fim de tudo. e a última certeza. que é ouvindo as pessoas que se aprende. cada chefe, uma visão. mas é preciso ir mais e ouvir mais gente. a senhora do economato que sorri e ajuda e prova e diz: está bom! ou alguém que tem ajudado muito criando momentos para nós aprendermos para além do óbvio que nos diz: porque não revê isto, este sabor. não ter medo de ouvir que algo não está como o esperado. evoluir a partir daí. não é rebatendo só para provar um ponto de vista que crescemos na cozinha. é partindo muita pedra. trabalhando imenso. falhando muito mais do que se acerta. é por isso que um exame, um momento de avaliação em que alguém que prova diz: é pá, isto está mesmo bom, fica na memória como um abraço a todos aqueles que deram a sua opinião. há nisto algo de certo. que nunca, quem cozinha, cozinha sozinho. e que um exame nunca é só um exame. é mesmo o momento em que começamos a pensar: o meu caminho é este. mesmo que conheça, todos ou quase todos os outros, sei que é uma cozinha com identidade que quero para mim. por isso e por tudo, esta aventura de aprender cozinha que agora fecha uma parte do pano tem-me ensinado muito mais do que alguma vez esperei...

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